DAS VERBAS RESCISÓRIAS DO EMPREGADO FALECIDO

Além de todas as responsabilidades que são atribuídas as empresas, também existem fatídicas situações que, além de inesperadas, exigem mais atenção e precaução da gestão.

Quando acontece o falecimento de um empregado, cabe à empresa efetuar o pagamento das verbas rescisórias aos familiares, e é comum que a família do falecido procure a empregadora rapidamente para o recebimento do montante.

Em que pese tal situação gere desconforto e desespero para receber os valores, bem como levando-se em conta a urgência em suprir as necessidades que decorrem do óbito, há de se destacar que se faz necessário algumas cautelas para efetuar o pagamento.

Diferentemente da sucessão prevista na esfera cível, a seara trabalhista possui regulamento próprio e, apenas na ausência de previsão específica sobre o assunto é que se deve ser aplicado o Código comum.

Sobre o assunto, a Lei nº 6.858/1980, prevê que as verbas não recebidas em vida pelo respectivo titular deverão ser pagas, em quotas iguais, aos dependentes habilitados perante a Previdência Social, ou de acordo com a legislação específica dos servidores civis e militares. Vejamos:

Art. 1º – Os valores devidos pelos empregadores aos empregados e os montantes das contas individuais do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço e do Fundo de Participação PIS-PASEP, não recebidos em vida pelos respectivos titulares, serão pagos, em quotas iguais, aos dependentes habilitados perante a Previdência Social ou na forma da legislação específica dos servidores civis e militares, e, na sua falta, aos sucessores previstos na lei civil, indicados em alvará judicial, independentemente de inventário ou arrolamento.

Observe-se que para o pagamento das verbas do de cujus ao familiar, não é necessário abertura ou inclusão em inventário ou arrolamento, mesmo que não haja habilitados perante a previdência social e seja necessário respeitar a ordem de sucessores previstos no Código Civil.

Por outro lado, em que pese tal circunstância aparente ser via facilitada e sem burocracias, há de se ressaltar que é necessário ter certeza a quem pagar.

Assim, mesmo que haja conhecimento de quem era a esposa, filho, ou o familiar que deverá receber o valor, é indispensável verificar se este consta como dependente cadastrado junto à Previdência Social, mediante a emissão de uma certidão junto ao INSS.

Nesse mesmo sentido também é o posicionamento da jurisprudência:

FALECIMENTO DO EMPREGADO. SUCESSÃO. Os valores devidos pelos empregadores aos empregados não recebidos em vida pelos respectivos titulares, serão pagos, em quotas iguais, aos dependentes habilitados perante a Previdência Social ou na forma da legislação específica dos servidores civis e militares, e, na sua falta, aos sucessores previstos na lei civil, segundo a regra prevista no art. 1º da Lei nº 6.858/80. (TRT-4 – AP: 00005744320135040030, Data de Julgamento: 05/07/2019, Seção Especializada em Execução).

Vale ressaltar, ainda, que podem haver herdeiros desconhecidos, ou demais situações inusitadas das quais a empresa pode se precaver solicitando ao familiar a respectiva certidão.

Não havendo dependentes cadastrados, não sabendo a quem pagar, existindo a possibilidade de outros herdeiros, ou ainda acontecendo a recusa do familiar de apresentar a certidão de dependentes, a fim de se resguardar, a empresa deverá depositar o valor em juízo, através de ação de consignação em pagamento, e assim garantir o cumprimento de sua obrigação de pagar o que entende devido.

Outrossim, como as verbas são de natureza trabalhista, a competência para a propositura da ação também é na justiça especializada. Vejamos:

AÇÃO DE CONSIGNAÇÃO em PAGAMENTO. VALOR DEPOSITADO OBJETO DE LITÍGIO NA JUSTIÇA COMUM ESTADUAL. INVENTÁRIO. DISPUTA ENTRE HERDEIROS. DECLARAÇÃO DE QUITAÇÃO. ORDEM DE DEPÓSITO NA CONTA VINCULADA DO EMPREGADO FALECIDO. NULIDADE DA SENTENÇA TRABALHISTA. INEXISTÊNCIA. Promovido pelo empregador, em Ação de Consignação em Pagamento, o depósito do valor devido ao empregado falecido, em virtude da extinção do contrato de trabalho, cabe, efetivamente, ao juiz/juíza do trabalho, nos limites da competência que lhes é deferida, não havendo impugnação específica, declarar quitada a obrigação, eis que a parte consignante não pode ser prejudicada pela disputa que se trava entre os possíveis herdeiros. Lado outro, não estando ainda resolvido, no Juízo Cível, sobre quem sejam os efetivos sucessores do falecido e havendo ação judicial em que se discute, inclusive, possível união estável, além do processo de inventário, mister que a Justiça do Trabalho, como se fez na sentença recorrida, determine o depósito da quantia consignada na conta vinculada do trabalhador para que, adiante, o juiz competente decida sobre quem sejam os legítimos credores. Sentença mantida. Recurso ordinário conhecido e não provido. (TRT-7 – RO: 00000333320205070013 CE, Relator: DURVAL CÉSAR DE VASCONCELOS MAIA, Data de Julgamento: 19/02/2021, 1ª Turma, Data de Publicação: 19/02/2021)

Consolidada a competência, imperioso frisar que o § 6º do art. 477 da CLT dispõe sobre o prazo de dez dias para pagamento das verbas rescisórias, bem como o §8º do mesmo artigo fala sobre a aplicação de multa equivalente a um salário do trabalhador se desrespeitado o prazo estipulado para o pagamento.

No entanto, há de se destacar que a 7ª Turma do Superior do Trabalho, no processo nº 10923-30.2017.5.15.0137 afastou a aplicação da multa por atraso no pagamento das verbas, sob a fundamentação de que a lei não especifica no caso do falecimento do empregado, e o mesmo ocorreu no processo nº ARR-1258-31.2013.5.05.0194, com a decisão da 8ª Turma do TST.

Da mesma forma, a SBDI-1 do TST também se posicionou no sentido de ser indevida a respectiva multa por constituir forma de dissolução incompatível com a aplicação do dispositivo.

De mais a mais, em que pese o posicionamento do Colendo Tribunal Superior do Trabalho, ainda existem julgados que discutem a aplicação da multa e, inclusive quando se trata do tempo da propositura da ação de consignação. Vejamos:

ACÓRDÃO 1ª TURMA RUPTURA CONTRATUAL. FALECIMENTO DO TRABALHADOR. MULTA PREVISTA NO ART. 477, DA CLT. CABIMENTO. Se a ré tinha dúvida em relação aos dependentes, ou se objetivava se ver livre da mora de que trata o art. 477, da CLT, poderia ter procedido ao depósito judicial do valor líquido das verbas rescisórias até o prazo máximo previsto na legislação para pagamento, mediante Ação de Consignação em Pagamento. E, assim, colocaria à disposição dos dependentes ou sucessores os valores não recebidos em vida pela empregada. Ao simplesmente alegar o desconhecimento acerca dos beneficiários e manter-se inerte até que havida provocação judicial, a empresa agiu com imprevidência e com desprezo pela dor e pelo sofrimento dos sucessores, em especial a mãe da trabalhadora, ora autora, que passou pelo infortúnio de em um só momento perder sua filha, tão jovem, e seu neto (a), que não teria sobrevivido ao parto, de acordo com os relatos da própria reclamada. Não foi solidária ou cuidadosa nesse sentido, omitindo-se ao pagamento daquilo que devido, mantendo em seu patrimônio valores cuja titularidade não detinha. Recurso não provido. (TRT-1 – RO: 01018081320165010203 RJ, Relator: JOSE NASCIMENTO ARAUJO NETO, Data de Julgamento: 23/02/2021, Primeira Turma, Data de Publicação: 10/03/2021)

Conclui-se, portanto, que é necessário cautela e atenção das empresas para efetuar o pagamento das verbas rescisórias no caso de falecimento de um dos seus empregados, devendo observar o prazo, por precaução, a fim de evitar discussões e gerar morosidade, bem como observar os trâmites da lei específica que rege a matéria e dispensa inventário ou arrolamento, e ainda a justiça especializada do trabalho que é competente para julgar as respectivas ações de consignação, que afastam a dúvida e garantem o cumprimento da obrigação.

Por Bárbara Vieira Contin

Referências bibliográficas:

http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2015-2018/2015/lei/l13105.htm; Acesso em 28/04/2021

http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/del5452.htm; Acesso em 28/04/2021

http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l6858.htm; Acesso em 28/04/2021

https://www.conjur.com.br/2021-mar-23/multa-atraso-rescisao-incabivel-morte-empregado; Acesso em 29/04/2021

MARTINS, Sergio Pinto. Direito Processual do Trabalho: Doutrina e prática forense. São Paulo: Atlas S.A, 2009.